Radiola em transe encerra longa espera do fã clube do Criolina

Radiola em transe. Capa. Reprodução
Radiola em transe. Capa. Reprodução

 

O duo Criolina acaba de lançar Radiola em transe [Sete Sóis], disco novo de inéditas, sucessor de Cine tropical [2009], há tempos aguardado pelo fã clube fiel de Alê Muniz e Luciana Simões. Nesse período eles optaram por tornar a morar em São Luís e produzir a partir daqui – Radiola em transe foi gravado em São Paulo, mas o show de lançamento aconteceu na capital maranhense, mês passado.

Nos anos que separam o segundo e o terceiro discos, o Criolina lançou o ep Latino-americano (aliviando a sede do fã clube) e o videoclipe da música homônima, em parceria com Bruno Batista, ampliando o leque de parceiros – em seu ótimo Bagaça, ele registrou outra parceria com o duo –, além de inventar e consolidar o Festival BR 135, incorporado ao calendário cultural do Maranhão e responsável por colocar definitivamente o estado na rota dos grandes festivais de música pop no Brasil. As 13 faixas de Radiola em transe são completamente inéditas – nada de Latino-americano foi requentado aqui.

Transe (Alê Muniz e Luciana Simões), que abre o disco, é um bom cartão de visitas: “na radiola ouço um disco tocando/ rock and roll, rock and roll/ e passa o tempo, a trilha vai mudando/ body and soul”, anunciam a que vieram. Radiola é tanto o apelido comumente dado a antigos aparelhos de som domésticos quanto aos paredões de caixas de som que embalam festas de reggae em todo o Maranhão. “E quando cai na pele/ o som se espalha, enraíza/ a música que bate, corta e não cicatriza/ um bom compositor não vira só um nome na camisa”, continuam, falando sobre os sentimentos que a música pode despertar.

Embalado em belo projeto gráfico (assinado por Amanda Simões, irmã de Luciana) de cores vibrantes, traduzindo literalmente os sons contidos nesta/e Radiola em transe, o disco aponta a importância do reggae para o cenário cultural do lugar de origem do casal musical e confessa a influência do ritmo jamaicano sobre sua obra – reverenciando Gregory Isaacs, Compacto 76 (Luciana Simões) é destaque, em repertório de alto nível. Dizer, no entanto, tratar-se de um disco de reggae é apequená-lo.

Radiola em transe/ acionando pedais gigs e beats/ aplacando dores edemas artrites/ tocando pedras raggas baladas e hits/ em kombis fuscas mavericks”, aponta o manifesto do poeta Celso Borges (parceiro de Alê Muniz em Essa menina e Ponta verde, ponte sonora entre a ilha de São Luís e a África, repetindo a experiência de São Luís-Havana, parceria dos dois com Luciana, do disco anterior) no encarte, citando a gíria “pedra”, que define o reggae de qualidade nos salões da ilha, em cena que afinal, ele, jornalista então em início de carreira, teve papel crucial na consolidação, pelos idos anos 1980. “Radiola em transe/ regando o gogó do cantor/ na veia jugular do cantador/ batucando crioula mina terreiro tambor”, continua, citando outras influências – sempre ampliando o leque.

Alê Muniz (guitarra, violão e voz) e Luciana Simões (gaita e voz) são acompanhados por Gerson da Conceição (contrabaixo e backing vocal), Isaías Alves (bateria e backing vocal), João Simas (guitarra e backing vocal), Michelle Abu (percussão), Ricardo Prado (piano, teclados e guitarra), Rovilson Pascoal (guitarra, banjo, moog e sintetizador) e Serelepe (trombone) em disco feito também de paisagens, para além das fotos da dupla (assinadas por Márcio Vasconcelos) no encarte.

Radiola em transe passeia por terreiro, tambor de crioula, lelê (danças típicas do Maranhão), Jaracaty (título de uma faixa, parceria de Alê e Lu), Vila Itaqui-Bacanga, Camboa, bairros da capital maranhense, e Bequimão e Cururupu (municípios maranhenses que dão título a Rocksteady de Bequimão a Cururupu, parceria de Alê Muniz, Luciana Simões e Gerson da Conceição).

O disco presta deferências ainda aos compositores Tião Carvalho (nascido em Cururupu, radicado há 30 anos na capital paulista), cuja A mulher mais bonita do mundo mistura-se a A menina do salão (Alê e Lu), e João Madson (o Madinho, tio de Alê, falecido em fevereiro passado), homenageado em Goodby my fella (Alê e Lu), que encerra o disco.

Ao “se melhorar estraga”, jargão do homenageado final, anotado ao pé da curta letra da música, sobre o disco eu acrescentaria apenas: valeu a pena esperar.

Ouça Compacto 76 (Luciana Simões):