Filhos de Freud

Documentário traça rico painel da psicanálise no Brasil

[O Imparcial, ontem] 

 

Hestórias da psicanálise. Cartaz. Reprodução
Hestórias da psicanálise. Cartaz. Reprodução

A princípio, o título Hestórias da psicanálise – Leitores de Freud [documentário, Brasil, 2016, 96 minutos; em cartaz no Cinépolis São Luís Shopping] pode afastar espectadores que não se julguem conhecedores da obra do pai da psicanálise, mas o que vemos no filme de Francisco Capoulade, ele também psicanalista, é um desfile de depoimentos sobre diversos aspectos da obra e vida do importante pensador austríaco.

Sérgio Paulo Rouanet, que empresta nome à controversa lei federal de incentivo à cultura, sancionada quando ele era secretário da Cultura do governo Collor, inicia aproximando o universo de Freud do de Machado de Assis, quando relata ter recomendado a alguém, ao fim de uma palestra, livros do bruxo de Cosme Velho, insistindo na dica quando é aprofundado o recorte: “mas eu estava falando de psicanálise”, disse sua interlocutora, ao que ele repete, “Machado de Assis”.

É uma espécie de senha para o elogio da linguagem em Sigmund Freud. Não são poucos os relatos dos que se apaixonaram pelo autor pela forma como ele escreve, a despeito de, a princípio, não terem entendido nada – não é um filme baseado em achismos, estamos diante de autoridades quando o assunto é o legado freudiano, uma espécie de mapa psicanalítico do Brasil, cujas belas paisagens, ao lado de Áustria e Alemanha, ligam os diversos capítulos que formam a película, passeando, além do personagem lido, por temas como cultura, história e tradução – não à toa o trocadilho do título do filme, que começa com o vai e vem da maré e vozes sobrepostas dialogando em alemão, língua em que Freud escreveu toda a sua obra.

É uma espécie de desnudamento de Freud – autor para o qual o sexo, “assunto popular”, é tão caro – para iniciados ou não, a partir de particularidades do pensamento brasileiro, em que o autor é, de algum modo, popular, mesmo entre os que nunca o leram ou nunca frequentaram um divã. Impossível não lembrar o “Freud explica” com que Zé Ramalho pontua sua Chão de giz, quase um dito popular.

Depoimentos, entre outros, de André Carone (filósofo e tradutor), Christian Dunker (psicanalista e escritor), Cristiana Facchinetti (psicanalista e historiadora da psicanálise), Hannes Stubbe (psicólogo e escritor), Joel Birman (psicanalista), Lúcia Valladares (psicanalista e historiadora da psicanálise), Luiz Alberto Hanns (psicanalista e tradutor), Lya Luft (escritora), Mário Eduardo C. Pereira (psicanalista e psiquiatra), Paulo César de Souza (germanista e tradutor), Ricardo Goldenberg (psicanalista e escritor) e Terêncio Hill (psicanalista e pensador) ajudam a compor um rico – e brasileiríssimo – painel sobre a importância, pluralidade, popularidade e atualidade de Freud.

É um documentário convencional e um pouco cansativo, os depoimentos seguindo-se, um após o outro, na montagem do rico painel. Necessário para, desta vez, em vez de algo ser explicado por Freud, tentar entendê-lo.

Veja o trailer: