O compositor Josias Sobrinho em show em Teresina/PI, circa 1978. Foto: Assaí/ Acervo pessoal/ Josias Sobrinho
Certa feita brinquei com Josias Sobrinho: seu estúdio deveria se chamar Tramaúba, não Opus. Tramaúba, o nome do povoado que ele nasceu, à época Penalva, hoje Cajari. De Cajari pra capital, de pra lá da Ponta d’Areia para o mundo. Falo de um de nossos maiores compositores, gravado por nomes como Betto Pereira, Cláudio Pinheiro, Ceumar, Chico Maranhão, Diana Pequeno, Flávia Bittencourt, Leci Brandão, Lena Machado, Papete, Rita Benneditto e Xuxa, entre muitos outros.
Conheci Josias Sobrinho antes mesmo de conhecê-lo, embalado por suas toadas que conheço, aprecio e canto desde a infância, com que fui ninado e com que ninei meu filho. Cara de pau que sou, há muito tempo entreguei-lhe em mãos um poema que escrevi, quando ele dava expediente em sua extinta livraria Espaço Aberto, na Rua do Sol. Levou mais de 10 anos, mas ele musicou o poema – que virou uma toada de boi de zabumba. Depois eu colocaria a letra na melodia de um tango seu e até aqui este é o tamanho de nossa parceria musical.
No início do mês, entrevistei-o numa edição do TimbirAlive; quem perdeu (ou quer ver de novo) pode conferir no IGTV da Rádio Timbira AM (@radiotimbira, no instagram). Um bate-papo descontraído, em que ele brindou a audiência e o repórter com duas de suas antológicas criações: Engenho de flores e Bacurau pragueiro. Só então me toquei que nunca o havia entrevistado, não formalmente, não diante de câmera ou com um gravador ligado – apesar dos muitos anos de amizade, parceria, alguns espaços comuns de trabalho e a admiração que nutro desde sempre por este cidadão do mundo que não tira o chapéu pra qualquer vagabundo.
Se uma entrevista formal, digamos, era algo inédito, não faltam ao currículo generosas doses de boa conversa regada a laudas e laudas de cachaça temperada, sobretudo no balcão do Batista, a lendária cachaçaria na Travessa da Lapa, no Desterro, onde é proibido fotografar e, por conta de uma selfie, uma vez fizemos um juramento ao proprietário de nunca mais por os pés ali – quebrado quase imediatamente após a cura da ressaca, potencializada pela mistura decorrente de querermos sempre experimentar ou relembrar vários sabores, o máximo de sabores, numa mesma rodada.
Se as regras de isolamento social têm nos impedido de atualizar o papo pessoalmente e de dar um abraço idem no dia de seu aniversário, vulgo hoje, significa apenas uma coisa: no capitalismo afetivo, tudo o que atrasa também deve ser pago com juros e correção etilírica.
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13 músicas para você conhecer ou admirar ainda mais Josias Sobrinho:
Quarta edição de RicoChoro ComVida terá Vinil Social Club, Regional Tira-Teima, Josias Sobrinho e a participação especial de Maria Vitória
O Regional Chorando Callado e a cantora Anna Cláudia, mais o Regional Tira-Teima e a cantora Luciana Simões realizaram duas edições extras de RicoChoro ComVida, na programação cultural da Semana Nacional de Ciência e Tecnologia no Maranhão. O projeto chega à sua quarta edição ordinária neste sábado (31), a partir das 18h, no Restaurante Barulhinho Bom (Rua da Palma, 217, Praia Grande).
As atrações da vez são o DJ Marco Antonio Brito, que quando risca agulhas assume a identidade de Vinil Social Club, o Regional Tira-Teima, mais antigo grupamento de choro em atividade no Maranhão, e Josias Sobrinho, um dos mais respeitados compositores do Brasil, já gravado por nomes como Ceumar, Diana Pequeno, Leci Brandão e Papete, entre muitos outros. A noite terá ainda a participação especial de Maria Vitória, talento-mirim recém-revelado pelas mãos da mãe produtora Ópera Night.
Os ingressos para a quarta edição de RicoChoro ComVida podem ser adquiridos no local. Reserva de mesas pode ser feita pelo telefone (98) 988265617.
O DJ Marco Antonio Brito, vulgo Vinil Social Club. Acervo pessoal
Marco Antonio Brito explica por que o nome artístico de Vinil Social Club: “remete ao trabalho que desenvolvo nessa área, que é dar ênfase ao vinil, resgaste e preservação da música e acima de tudo na ritualização de se escutar música. O vinil é o único molde de propagação de música gravada que você pode ver claramente de maneira material a música sendo reproduzida. O ritual de pegar um disco, retirar da capa, por para tocar e ver a rotação hipnotizante do disco rolando na vitrola faz com que nos concentremos em escutar a música e possibilita um grau maior de sentir e entender a música”, explica.
“Nessa apresentação, selecionaremos do nosso acervo de LPs e compactos muito choro, que pelo nome do projeto [RicoChoro ComVida] e no que ele se predispõe fazer não poderia ser diferente, e também tudo que essa música belíssima influenciou na musica brasileira. Teremos muito samba, bossa, jazz samba, samba jazz, samba rock, música regional, todo esse universo eclético que forma a música e alma brasileiras”, antecipa o repertório, ele que se apresenta todas as terças-feiras no Bar Chico Discos.
O Regional Tira-Teima durante apresentação na Semana Nacional de Ciência e Tecnologia do Maranhão. Foto: Rivanio Almeida Santos
Formado por Paulo Trabulsi (cavaquinho solo), Luiz Jr. (violão sete cordas), Zeca do Cavaco (cavaquinho centro), Zé Carlos (percussão), Serra de Almeida (flauta) e Henrique (percussão), o Regional Tira-Teima está na ativa desde o final da década de 1970. A formação original contou, entre outros, com nomes como o multi-instrumentista Ubiratan Sousa – de um choro de sua autoria o grupo herdou o nome – Adelino Valente (bandolim), Antonio Vieira (percussão), Sérgio Habibe (flauta), Cesar Teixeira (cavaquinho), Chico Saldanha (violão) e Arlindo Carvalho (percussão). O único remanescente da formação original é Paulo Trabulsi, que com 17 anos participou da gravação do antológico Lances de Agora [1978], de Chico Maranhão, realizada por Marcus Pereira para sua gravadora, na sacristia da secular Igreja do Desterro.
O grupo está às vésperas de lançar seu primeiro disco, cujo repertório mescla peças autorais a um trabalho de pesquisa de choros de autores maranhenses antigos, nos moldes do inaugural Choros maranhenses [2005], do Instrumental Pixinguinha, primeiro registro fonográfico inteiramente dedicado ao choro no Maranhão.
O produtor Ricarte Almeida Santos entusiasma-se com a notícia: “já é mais que hora de ouvirmos um registro gravado do Tira-Teima. Pela importância de seus membros, pela longevidade do grupo e por tentativas anteriores que infelizmente foram abandonadas”, afirma. Algumas peças do disco, já anunciadas em entrevistas de seus membros à série Chorografia do Maranhão, poderão ser ouvidas durante a apresentação. Entre elas Dom Chiquinho, Choro nobre e Choro embolado, de Serra de Almeida, Gente do choro e Meiguice, de Paulo Trabulsi.
O compositor Josias Sobrinho. Foto: Fafá Lago
O Regional Tira-Teima receberá o compositor Josias Sobrinho, que se tornou nacionalmente conhecido ao ter quatro composições incluídas por Papete em Bandeira de Aço [Discos Marcus Pereira, 1978], um divisor de águas para a música popular produzida no Maranhão. O cantor e percussionista gravou De Cajari pra capital, Engenho de Flores, Dente de ouro e Catirina, até hoje entre as mais conhecidas da lavra de Josias Sobrinho.
Era o começo. Depois ele gravaria seus próprios discos, sendo Dente de ouro [2005] o mais recente, e seria gravado e regravado por diversos intérpretes, no Maranhão e em outros estados. Casos de Engenho de flores (regravada por Diana Pequeno), Rosa Maria (Ceumar, Leci Brandão e Cláudio Pinheiro), Porco espinho (Fátima Passarinho), Terra de Noel (Flávia Bittencourt), Quadrilha (parceria com Sérgio Habibe, Godão, Ronald Pinheiro e Chico Maranhão, gravada por este último e por Papete), O biltre (Rita Ribeiro, hoje Benneditto), As perigosa (Ceumar) e Dente de ouro (Cláudio Lima), entre muitas outras.
O compositor Josias Sobrinho na época do Rabo de Vaca. Acervo pessoal
Parte desse repertório autoral será apresentado por Josias. “Vou tocar um choro que fiz na época do Rabo de Vaca [grupo dos anos 1970, então integrado por Josias]. Nosso grupo começou tocando chorinho, mas faço também um choro cantado, além de sambas meus e de outros compositores”, adianta.
Ele diz ver com bons “olhos e ouvidos” a iniciativa do RicoChoro ComVida e comenta também o significado de ser o convidado da vez. “Somente uma música com tão ricas tradições pode proporcionar a gerações continuadas possibilidades desta envergadura. Parabéns a todos que têm algo a ver com a realização do projeto. É a história se impondo à incongruência dos fatos. Afinal, o Choro tem vida! Pra mim é muito gratificante participar desse grande momento cultural. Ter minha música inserida no contexto do choro é elogioso e distinto. Sou muito grato pelo convite, afinal de contas esta é uma iniciativa que retoma histórias tantas, representadas nas figuras destacadas de Ricarte, Tira-Teima, Luiz Jr., o Clube do Choro, Chico Canhoto, Célia Maria, Léo Capiba, João Neto [seu sobrinho] e tantos outros”, destaca Josias.
A pequena Maria Vitória em seu show de estreia. Acervo pessoal
A pequena Maria Vitória cresceu entre boas influências musicais: é filha do cantor e compositor Santacruz e da produtora Ópera Night, em cujo currículo constam vários nomes importantes da música brasileira trazidos por ela à ilha. Recentemente a mãe resolveu produzir a própria filha, em um show com participações especiais de outras crianças sintonizadas com o que de melhor se produz em termos musicais no Brasil e no Maranhão.
Na participação especial que fará no show de “tio Josias”, como ela carinhosamente chama o artista, ele também uma de suas referências musicais, Maria Vitória fará uma homenagem ao saudoso e eterno João Rubinato, o ítalo-paulista cuja música tornou-se sinônimo da maior cidade do país: Adoniran Barbosa.
Produção de RicoMar Produções Artísticas, RicoChoro ComVida tem patrocínio da Fundação Municipal de Cultura (Func), Gabinete do Deputado Bira do Pindaré, TVN e Galeteria Ilha Super, e apoio do Restaurante Barulhinho Bom, Calado e Corrêa Advogados Associados, Sonora Studio, Clube do Choro do Maranhão, Gráfica Dunas, Sociedade Artística e Cultural Beto Bittencourt e Musika S.A. Produções Artísticas.
Divulgação
Serviço
O quê: RicoChoro ComVida – 4ª. edição Quem: Vinil Social Club, Regional Tira-Teima, Josias Sobrinho e participação especial de Maria Vitória Onde: Restaurante Barulhinho Bom (Rua da Palma, 217, Praia Grande) Quando: 31 de outubro (sábado), às 18h Quanto: R$ 30,00. Reserva de mesas pelo telefone (98) 988265617