
Encontrei Diógenes Moura anteontem, no Centro de Criatividade Odylo Costa, filho. Instantes antes, no Teatro Alcione Nazaré, naquele espaço, eu assistia à solenidade de lançamento da 9ª. Feira do Livro de São Luís (de 2 a 11 de outubro próximo), quando o fotógrafo Márcio Vasconcelos me avisou de sua presença.
A ele fui apresentado pelo poeta Celso Borges, de quem já havia recebido, por e-mail, um release sobre um sarau coletivo que terá lugar hoje (6), no Cine Praia Grande, às 20h.
Diógenes Moura presenteou-me com seu livro Fulana despedaçou o verso (2014), caprichada edição da Terra Virgem. Reconheci a personagem na capa, pernas cruzadas, um seio à mostra, cigarro na mão, sentada sobre uma colcha aveludada, com um estranho cão de porcelana a mostrar os dentes. Eu podia estar enganado, mas conferindo a ficha técnica, tive a certeza: “Claudia Wonder!”, exclamei, para o autor discorrer rapidamente sobre a amiga, falecida há pouco mais de quatro anos.
“Ela era maravilhosa! No show O vômito do mito [em que se lançou como cantora, na década de 1980], no Madame Satã [mítico clube paulistano], ela cantava e se deitava em uma banheira de sangue. Ela morreu da doença do pombo [criptococose]. Eu odeio pombos. Perdi dois amigos em questão de meses por causa da doença do pombo”, revelou.
O livro bonito de Diógenes, capa dura, não se folheia da esquerda para a direita, como convencional, mas de baixo para cima, como um bloco de anotações – “Do lado de dentro tudo é confidencial”, adverte a lombada. Só há texto nas páginas ímpares, os versos são desperdiçados, trocadilho infame com o título. “No centro do pátio a velhinha olha o azul e degola os pombos” numa passagem. Noutra, a musa amiga e seu citado show são personagens: “Claudia Wonder viva, fleuma de fumaça na parede do museu de arte moderna. O vômito do mito”, escreve.
Sua prosa é milimétrica, concisa, elegante. Seus personagens percorrem um submundo marcado pela passagem das horas – o que pode soar óbvio, mas creiam, não é –, recheado de citações pop. Não esqueçamos que Diógenes Moura foi curador da Pinacoteca do Estado de São Paulo, transformando seu acervo num dos mais importantes da América Latina.
Com o monólogo Carne é sangue – imagens para uma consciência humana, Diógenes Moura lança hoje, em São Luís, Fulana despedaçou o verso. “Como não sou muito de palestras e mesas redondas, esse é um formato onde posso me expressar como escritor, curador de fotografia, editor e sobre a vida e a morte, literatura e imagem, desejo e voragem, sexo, drogas e sobre quem nasce num corpo errado, quem não sabe nada de si mesmo”, afirma o artista, no material de divulgação.
Carne é sangue é fruto de mais de 10 anos de pesquisas sobre fotografia e literatura. O monólogo já foi apresentado em diversos palcos do Brasil e da América Latina. Durante o espetáculo, o texto de Diógenes Moura dialoga com a projeção de fotografias de Ana Carolina Fernandes, Ana Mocarzel, André Cypriano, Antoine D’Agata, Cesário Triste, Claudia Guimarães (autora da foto da capa de Fulana despedaçou o verso), Dóris Haron Kasco, Eliott Erwuitt, Loren McIntyre, Mario Cravo Neto, Marlene Bergamo, Monica Piloni, Monica Vendramini e Wagner Almeida.
A Diógenes, no entanto, não bastam estas companhias: Carne é sangue une-se à poesia de Ferreira Gullar, que terá fragmentos do Poema sujo interpretados pela atriz Áurea Maranhão – a exposição fotográfica Visões de um Poema sujo, de Márcio Vasconcelos, segue em cartaz no Museu de Artes Visuais (Rua Portugal, Praia Grande). Acompanhado do baterista Isaías Alves, o poeta Celso Borges apresenta o recital Língua lambe lambe.
Serviço
O quê/quem: Monólogo Carne é sangue – imagens para uma consciência humana e lançamento do livro Fulana despedaçou o verso, de Diógenes Moura + performance de Áurea Maranhão com trechos do Poema sujo, de Ferreira Gullar + recital Língua lambe lambe, com Celso Borges e Isaías Alves
Quando: hoje, 20h
Onde: Cine Praia Grande (Centro de Criatividade Odylo Costa, filho, Praia Grande)
Quanto: R$ 10,00